sábado, 31 de dezembro de 2011

sexta-feira, 30 de dezembro de 2011

serendipity



Os amantes de hoje preferem a droga mais leve, o tabaco mais light ou o café descafeinado. Já ninguém quer ficar pedrado de amor ou sofrer de uma overdose de paixão. As emoções fortes são fracas e as próprias fraquezas revelam-se mais fortes. Os amantes, esses, são igualmente namorados da monotonia e amigos íntimos da disciplina. O que está fora de controlo causa-lhes confusão, e afecta-lhes uma certa zona do cérebro, mas quase nunca lhes toca o coração. O amor devia ser sonhado e devia fazê-los voar; em vez disso é planeado, e quanto muito, fá-los pensar.
Sobre o amor não se tem controlo. É um sentimento que nos domina, que nos sufoca e que nos mata. Depois dá-nos um pouco vida. No amor queremos viver, mas pouco nos importa morrer e estamos sempre dispostos a ir mais além. Deixamo-nos cair em tentação, e não nos livramos do mal, embora procuremos o bem. No amor também se tem fé, mas não se conhecem orações: amamos porque cremos, porque desejamos e porque sabemos que o amor existe. Amamos sem saber se somos amados, e por isso podemos acabar desolados, isolados e deprimidos. Que se lixe! O amor não é justo, não é perfeito; no amor não se declaram sentenças nem se proferem comunicados. O amor prefere ser imprevisível, cheio de riscos e de fogo cruzado. No amor os braços não se cruzam, as palavras não se gastam e os gestos servem para o demonstrar. Amar também é lutar, e enfrentar monstros fabulosos com cabeça de leão, corpo de cabra e cauda de dragão. É uma ilusão, um sonho, um absurdo e uma fantasia. O amor não se entende, não se interpreta, não se discerne nem se traduz. Quem ama acredita, mas não sabe bem porquê, não sabe bem o quê, nem percebe bem como.

Rogério Fernandes, Alterne Activo

quinta-feira, 29 de dezembro de 2011

my gods dwell in temples made with hands


morality does not help me. i am a born antinomian. i am one of those who are made for exceptions, not for laws. but while i see that there is nothing wrong in what one does, i see that there is something wrong in what one becomes. it is well to have learned that.

oscar wilde, de profundis

é apenas um fragmento de tempo que não coincide com as circunstâncias da nossa vida



it is just a fragment of time that doesn't coincide with circumstances in our lives

quarta-feira, 28 de dezembro de 2011

acontece que agora



existe.

no distance to here



well, yesterday was kind of a different day, apparently cause i had no idea you would be on the other side. sooner or later the words had to be opened by that far away smile.
you said maybe it's all part of the bigger plan. that the days are going quite fast and technology is only a step behind the true nature we've all been hiding so well.
you showed me the economist and proved strongly how europe is giving her last breath and that the future is over there. wide open at your doorstep.
you waved at me the record you stole from your friends place, the songs playing over and over again on new year's eve.
i don't really know very well if it's the brooklyn heights or the vague memories of those greyish clouds over by dumbo at nightfall that reminded me of that woollen sweater.

it's closing time for now, the shops are empty and distant voices can be heard by each doorstep.

sooner than now, sooner than yesterday. the time will come.
the all time burglars keep coming to my head and the time will come.
just wait and see.

sábado, 24 de dezembro de 2011

sexta-feira, 23 de dezembro de 2011

a verdade pode ser dura

mas mais duro ainda é não procurar o seu ponto de ligação com as muitas que existem.

leiam a catarina

há como que um imperativo da estreia, entre dois seres que se amam.

«A par do desejo de alguma singularidade, na vida do outro, deseja-se estrear. Pode ser uma casa, uma cidade, um projecto. Tem é de ser alguma coisa. Não é justo que o outro já tenha dormido com alguém, antes, que tenha casado, que tenha tido um filho, que tenham ido juntos a Veneza. Justo seria que tivesse esperado por mim. No campo amoroso, a inauguração vale pontos. De cada vez que alguém diz nunca me tinham feito isso há um ego que cresce. Espera-se, no fundo, uma certa virgindade, espera-se abrir um caminho novo, estar onde nunca ninguém esteve. É aqui que o valor da estreia reside, numa falsa ideia de pureza, associada ao desconhecimento. Como se, por ser a segunda (ou a vigésima) vez, o gesto viesse gasto.

Lembro-me: dizia-se que as raparigas deviam guardar-se para alguém especial. Que isso de dar o corpo, pela primeira vez, é de tal forma importante, que não podia ser com a pessoa errada. Como se houvesse aqui algum tipo de irreversibilidade. Como se, depois de o fazeres uma vez, nunca mais fosses igual. Como se, dando o corpo, desses uma oportunidade - a de alguém vir estrear-te.

Não há nada mais despótico do que isto, esta tirania da pureza, que se arrasta pela vida toda. Esta ideia infeliz de que as coisas mais importantes são as que nunca tinham sido vividas antes. É por causa disto, que se alastra como uma praga por todos os compartimentos de uma vida, que as pessoas vivem sufocadas nas suas rotinas, convencidas de que precisam de alguma novidade. É por causa disto que se ama pouco, e mal. Que se perde tempo com ciúmes do passado, do símbolo, do mito alheio - um filme muitas vezes a milhas da realidade.

Aprender a surpresa naquilo que não é novo, isso sim, é um gesto de amor. O gesto que hoje se cumpre vem de trás, foi aprendido noutros lugares, com outras pessoas, mas chega aqui outro, novo, porque enfim, na minha direcção.

E o primeiro... Para dizer a verdade, não me lembro do nome dele. »

na trama

ouvimos, senhor.

reflexo

You can live in this illusion
You can choose to believe
You keep looking but you can't find the woods
While you're hiding in the trees

right where it belongs

nin

quinta-feira, 22 de dezembro de 2011

LISBOAA



cheira a casa!!

roubei uma imagem ao luís

mas o que queria mesmo era roubar-lhe o blog inteiro.

tu


foto: marta pessanha
Se eu largar eu sinto a sua falta
Se eu agarro ela perde a côr
Ela não é dos meus dedos
É dos meus medos

E faço-me passar por uma flor
Tento imaginar o que ela diz
À espera de aprender

À face da rua existe a lua
Mas não é tua
À margem da estrada não há nada
Mas já te agrada
Tu és o teu mundo
Tu és o teu fundo
Tu és o teu poço
És o teu pior almoço
És a pulga na balança
És a mãe dessa criança
És o mal
És o bem
És o dia que não vem

Agora pára de fazer sentido
Não vês que assim estás a pisar fora da estrada
Vê se agora páras de fazer sentido
Não vês que nada nos dirá mais do que nos diz nada

Vê que o meu coração ainda salta
Quer e julga ser capaz
Não o faça por meus medos
Faça nos dedos
E eu fico para ver o que ele faz
Sem imaginar o que eu não fiz
À espera de viver

À face da chama existe a fama
Mas não te ama
À margem do nada não há estrada
Já não te agrada
Tu és o teu preço
És a tua glória
Tu és o teu medo
És a parte má da história
Vê que o sol ainda brilha
Ainda tem por onde arder
Não é mau
Não é bem
São razões para viver

Agora pára de fazer sentido
Não vês que assim estás a pisar fora da estrada
Vê se agora páras de fazer sentido
Não vês que nada nos dirá mais do que nos diz nada

Se eu largar eu vou sentir a sua falta

Tu és tu sempre que tu és
És mesmo tu quando pensas que és outra coisa
E tu pensas que não mas tu és mesmo bom a ser sempre
Quem és
Daí o teu motivo ser inapagável
Daí o teu desejo ser incontornável
O prazer é tão maleável
Daí o seu valor ser inestimável

manel cruz

quarta-feira, 21 de dezembro de 2011

ar de graça


penso muitas vezes no bairro.
em como cada despedida é feita em determinada hora, quando a saída grita tão alto e nos deixa sem forças para mais nada a não ser aquela direcção.
existe nela sempre um regresso. porque nas memórias persistem as vozes daquela gente.
da vizinha que de manhã cedo me cumprimentava. debaixo de chuva ou de sol, ali estava ela, cotovelos apoiados na janela enquanto passeava a maggie, antes do trabalho. todos os dias perguntava como eu estava. e desejava os bons dias, à antiga. «continuação, menina».
o do 22, que tinha o pitbull que tentávamos evitar.
a dona do café que me guardava as cartas e entregava os censos e assava sardinhas enquanto conversávamos.
o paulo. que todos os dias vinha com uma história nova. a sofia, que vivia no limbo da violência, do criar dos filhos e do marido preso. a do largo, que vivia no medo de chegar a casa e dos gritos até anoitecer e o homem se cansar.
a barbuda e os concertos de trash metal até de madrugada.
o supermercado indiano e o vendedor, que não consigo achar igual.
os arraiais.
o mundo que se vivia naquelas calçadas enfiava-se a trancos e barrancos em mais um desalinho da cidade.
mas o que ali se aprendeu, o que se guardou como força que nos marca sem parar, pensar ou reter no ânimo momentâneo, essa a ideia vaga de que somos imortais.
ali, por momentos, seríamos capazes de tudo. passar e sobreviver. perdidos nas ruelas mais bonitas que algum dia vi. acordava nelas. dormia na penumbra do candeeiro amarelo que tremeluzia lá fora. vi as primeiras flores daquela árvore gigante ao centro do largo.
e agora já longe, volto ao bairro. volto a sentir as pedras por baixo dos pés que não param de caminhar.
seguro-me à inconstância da vida para alinhar o eixo desta terra por onde sonho.
cada regresso a casa é amar tudo outra vez. o suspenso renasce e revive o crescer por dentro.
nada voltará a ser como dantes, e o bairro sabe disso.
o paulo mostra-me o plano de requalificação, o largo vai ter laranjeiras a perder de vista. o orgulho e o brilho nos seus olhos faz-me estremecer.
volto ao bairro e ali consigo ver-me. ainda. sobe-se a escada com dificuldade. abre-se a porta de casa com alívio ao chegar. chega-se apenas para seguir andando. padecendo da saudade tão nossa. saber que podemos voltar e sorrir aos dias passados. saber que podemos voltar e seguir e todos estarão no lugar onde os deixámos. o pitbull. a vizinha de manhã. o paulo. a sofia. as cartas no café. até as ameaças disfarçadas de cuidados. até a marcha da mouraria que saiu em cortejo e escolta animada. tudo estará por ali outra vez.
nós é que não.

little drummer boy



«...tell me that you love me more. sleepless long nights, that is what my youth is for»

terça-feira, 20 de dezembro de 2011

a alegria de quem as vê passar e desaparecer



ver-te é como ter à minha frente todo o tempo
é tudo serem para mim estradas largas
estradas onde passa o sol poente
é o tempo parar e eu próprio duvidar mas sem pensar
se o tempo existe se existiu alguma vez
e nem mesmo meço a devastação do meu passado



a rua é das crianças, ruy belo, 1970

não ser hipócrita tem que se lhe diga

i am single, in the sense of not being married.

i can do anything i like to anyone i like.
with their consent.


woody allen

segunda-feira, 19 de dezembro de 2011

o limite a chegar

na grécia andam crianças em idade escolar a desmaiar nas aulas devido à fome.
os professores descobriram que muitos deles passam o dia inteiro sem comer e que devido à fraqueza, acabam por cair sem forças.

hoje, o ajuntamento de madrid decretou uma multa de 750 € a quem for apanhado a recolher restos de comida e a comer dos caixotes do lixo públicos.

se voltar a ouvir alguém a falar ou a pedir alguma idiotice para o natal... passo-me de vez.

da redundância



apenas lembro que aquece o corpo, os dias e as noites e não desiste de amar.
nunca.

alguém quer transformar as quatro paredes numa disco



e por isso juntámos bansky e keith haring e decidimos que as cores de casa podem ter ares de rua e movimento a todas as horas. especialmente quando se dorme.

domingo, 18 de dezembro de 2011

azar é...

finalmente conseguir ver tv na internet e apanhar logo o pinto da costa.

rylan

everybody wants to be amazing.

it is easy to keep so quiet.
everybody loves a quiet child.


the national

do que nos deixaram nas mãos

estou agora a ler as vossas mensagens. o que deixaram escrito no papel, nas paredes, através de vibração ou letras. e tudo me leva a crer que do que existe e resiste, as nossas gargalhadas e os passos de dança, as confissões e os abraços à maggie serão o melhor começo desta casa.

obrigada. por me deixarem assim. por deixarem connosco um pouco daquilo que sentem e são.
eternos já são os momentos. como estes.




e









eeeh pá!! esquecemo-nos do dartacão!!

sábado, 17 de dezembro de 2011

a música é orgânica e respira-se na pele.

da noite inaugural

dizem que o vizinho do frente é polícia.
que passa as noites a fumar e a engendrar planos para erradicar o mal do mundo. o cheiro é de tal forma intenso que a única solução que encontrei foi colocar umas inocentes velas de chá à porta de casa... a ver se o cheiro adocicado a cereja ameniza os fumos.

esta manhã, rapazola com os seus 11 anos passa a correr pelo patamar e grita à mãezinha, o que é isto, mãe?
ela mostra um silêncio enganador. deve lá ter os seus palpites. mas não lhos vai confessar.
o catraio pára à minha porta e lança um convicto: aaah estiveram ontem a fazer uma sessão espiritual! é isso!

eu por mim, prossigo na varridela e no bater de tapetes, que mais logo a casa vai estar cheia, e é preciso não desiludi-lo e manter as velas acesas.

arrepiar

sexta-feira, 16 de dezembro de 2011

1 de maio de 2012 - casa da música \O/



the magnetic fields, love at the bottom of the sea, 2012

adágio não é só música. nem iogurte.

it’s only when the tide goes out that you learn who’s been swimming naked.

warren buffett

a tirania da pureza

ADAM & THE AMETHYSTS - Dreaming (NSFWish) from kelprecords on Vimeo.

jean-jullien

o mundo repleto de deuses



A tua seta atirada ao alvo fende o céu e este logo se une
Poeira levada pelo vento espuma dispersa pela tempestade lembrança do viajante que se demora apenas um dia
tudo é sombra que passa

José Tolentino Mendonça, A Noite Abre Meus Olhos

a perfeição, cesariny e o canibal


quase 6 meses depois, o mito das diferenças

distingue-se a via norte da vci e até se sabe onde começa uma e acaba a outra! :P (para vocês é ridículo, mas bom, é confuso, tá!!?)
chega-se mais rápido a casa depois das oito da noite e todos os dias se dá por falta de algo. hoje é a chávena, amanhã é o talher, depois a ligação para as tomadas.

e hoje, quando achávamos que dominávamos as rotundas aepês e os nózes de francos, e o camandro, eis que nos atiram com esta:

«ahahaha estás pró, mas acho q é melhor n irmos pela via norte, n sei, damos uma grande volta :p o melhor é mm rotunda AEP e siga recto toda a vida :p»

mas que raio quer isto dizer?? aqui jurava-se que aquela coisa que segue do norte shopping era a via norte! lixaram-nos a noite de compras no ikea! lixaram-nos a certeza de não precisar mais de gps e de ir ter convosco a qualquer hora, onde estivessem! bom, qualquer lugar menos a margem sul. essa de gaia que ainda é o triângulo das bermudas.

já vos dissemos que hoje demorou-se mais de meia hora e 4 bairros de alcance a encontrar uma estação de correios que afinal era ao lado de casa? outra no trabalho?

quem ainda acha que a bússola aponta sempre para norte, e que com ele a nossa orientação é eximia e infalível, desengane-se. esqueça. o norte é a baralhação das auto-estradas, o conluio das scuts, os autocarros feitos gatos vadios pardos de noite, os metros de superfície e as confeitarias (pastelarias não existem!) em esquinas e ruelas de sonho.

e afinal... «mas essa não é a via norte???...»

«ahahahaahha não!!!!!
é avenida AEP do nó de francos até à rotunda AEP, dps passa a A28 lololol mas já estivemos na via norte ;)»

porra! que é sexta-feira, ao menos temos de acertar no engarrafamento!
isto nem com vinte anos lá vai.

retrospectiva caudal



há dias em que a maresia sobe, o sol se põe e as pessoas dormem sem sentirem o que por elas passou de rompante.
mas rompem-nos instantes em que temos de ser a mudança que queremos ver no mundo.
por eles, vibramos. destruímos e reconstruimos de novo.
é sempre das ruínas que nasce a força colossal de tempos novos.

planos para o futuro

aartedecontornarcocourbano.blogspot.com ;)

quarta-feira, 14 de dezembro de 2011

daquilo que somos


guardar.

do silêncio



A liberdade é a possibilidade do isolamento. És livre se podes afastar-te dos homens, sem que te obrigue a procurá-los a necessidade do dinheiro, ou a necessidade gregária, ou o amor, ou a glória, ou a curiosidade, que no silêncio e na solidão não podem ter alimento. Se te é impossível viver só, nasceste escravo. Podes ter todas as grandezas do espírito, todas da alma: és um escravo nobre, ou um servo inteligente: não és livre.

desassossego, fernando pessoa

quem ri por último

terça-feira, 13 de dezembro de 2011

o próximo passo



quando uma mulher faz tudo isto e ainda se equilibra na ponta dos pés enquanto mantém o mundo a girar incessantemente no seu eixo, parece que finalmente existe caminho.

domingo, 11 de dezembro de 2011

e de dançar até cair?

trent reznor & karen O = Immigrant Song - Led Zeppelin

domingo


A serenidade não é feita nem de troça nem de narcisismo, é conhecimento supremo e amor, afirmação da realidade, atenção desperta junto à borda dos grandes fundos e de todos os abismos; é uma virtude dos santos e dos cavaleiros, é indestrutível e cresce com a idade e a aproximação da morte. É o segredo da beleza e a verdadeira substância de toda a arte.
O poeta que celebra, na dança dos seus versos, as magnificências e os terrores da vida, o músico que lhes dá os tons de duma pura presença, trazem-nos a luz; aumentam a alegria e a clareza sobre a Terra, mesmo se primeiro nos fazem passar por lágrimas e emoções dolorosas. Talvez o poeta cujos versos nos encantam tenha sido um triste solitário, e o músico um sonhador melancólico: isso não impede que as suas obras participem da serenidade dos deuses e das estrelas. O que eles nos dão, não são mais as suas trevas, a sua dor ou o seu medo, é uma gota de luz pura, de eterna serenidade. Mesmo quando povos inteiros, línguas inteiras, procuram explorar as profundezas cósmicas em mitos, cosmogonias, religiões, o último e supremo termo que poderão atingir é essa serenidade.

Hermann Hesse, O Jogo das Contas de Vidro

sexta-feira, 9 de dezembro de 2011

começo



que seja a última vez que abres o flash enquanto conduzo.
que seja a última vez que passamos por baixo da ponte sem parar o carro e olharmos o rio com tempo.
que seja a última vez que nos esquecemos de ficar.

quinta-feira, 8 de dezembro de 2011

bate à porta


Despeço-me disto
Despeço-me da falta de dinheiro
Despeço-me dos sonhos adormecid...os
Despeço-me de nós
Despeço-me das memórias de tempos mais felizes
Despeço-me das ilusões de eternidade
Despeço-me da esperança
Despeço-me da fé em mim própria
Despeço-me de ter vontade
Despeço-me das birras
Despeço-me das brigas
Despeço-me da vida ao contrário

texto: rui pina coelho
foto: fania santos

quarta-feira, 7 de dezembro de 2011

do que é realmente importante



quando a maggie desapareceu por um dia, não sabíamos se estava viva ou morta, nem se a tinham levado, nem para onde, nem sequer a direcção que seguira, a que horas, onde, enfim, o terror da dúvida que nos deixou sem norte, até que alguém disse, calma, vamos começar por avisar toda a gente online. vamos começar a avisar toda a gente na rua. mas a noite caía e os becos escuros onde andámos, as lojas onde pedíamos para deixar cartazes, tudo fechava e o frio do norte, o frio que ela nunca soube o que era, nunca dormira na rua, não sabia atravessar a estrada, nem sequer devia saber onde ficava a casa. depois de a polícia me ter obrigado a catalogar o ocorrido em «extravio de bens» e que não valia a pena explicar que ela era uma pessoa, a minha família. o pânico. saber que trocaria tudo para a ter de volta em casa, quentinha e segura.
só me lembro de pensar no tanto que perdi e agora não podia perder a única coisa que ainda me dava sentido, que me fazia companhia, que sempre estivera comigo.
à noite tivemos notícias dela. asseguraram-me que não estava ao frio e que nem sequer tinha fome. que tinha companhia. e que esperava por mim, por nós todos.

e tu estavas comigo. perguntaste-me se queria comer. o que queria fazer... o que me apetecia.

-água. só quero água.

eu continuava sem ela. mas levaste-me. deste-me a mão. contaste-me de ti.
pedimos algo que nos aquecesse.
saímos juntos, demos uma volta à anémona e vimos o homem das castanhas.
- queres??? - perguntaste...
- não... sim!!!

comemos castanhas a ver o mar. as minhas primeiras do ano.
perdi a conta às vezes que me fizeste rir.
e por isso te digo sempre. as coisas vão e vêm. desaparecem quase todas.
ela. tu.
ficam.