segunda-feira, 30 de janeiro de 2012
urano
se todos os planetas decidissem parar de viver de acordo com a força gerada pelos satélites que orbitam os seus eixos, deixavam de girar.
sexta-feira, 27 de janeiro de 2012
da vaidade
Fiódor Dostoiévski- Cadernos do Subterrâneo
«gostava de comprar gomas, daquelas amoras»
adormeceste de phones :)))
Vergílio Ferreira
obrigada* por todo o devir :)
quinta-feira, 26 de janeiro de 2012
dizer
quarta-feira, 25 de janeiro de 2012
do poema feito no autocarro antes de partir para a catalunha
Para Carla um amigo será sempre um amigo, e adoro ser seu amigo.
Para Carla, Londontime, todos estao sempre a chegar tarde.
Para Carla nao há tempo ruim, apenas uma chuvinha passageira.
Para Carla, pisar na merda é dinheiro, estou com sorte!
Para Carla, nunca te pode faltar nada.
Para a Carla a Meggie nunca cheira mal, deve ser da rua este cheiro.
Para Carla nunca é tarde, podemos dançar mais um pouco.
Para Carla, o sorisso é uma premisa sempre.
Para ela, hospedarnos em sua casa é um prazer.
Para nós, estar em sua casa e partir, é um sofrer.
Obrigado Carlinha!!!
Beijosss, Thi : )
maluco!!
eu sei que não foi este que leste, mas prometo que a tradução que daqui vier, te chegará às mãos sexta-feira*
«Regresso devagar ao teu
sorriso como quem volta a casa. Faço de conta que
não é nada comigo. Distraído percorro
o caminho familiar da saudade,
pequeninas coisas me prendem,
uma tarde num café, um livro. Devagar
te amo e às vezes depressa,
meu amor, e às vezes faço coisas que não devo,
regresso devagar a tua casa,
compro um livro, entro no
amor como em casa.»
(Manuel António Pina, in
“Ainda não é o Fim nem o Princípio do Mundo. Calma é Apenas um Pouco Tarde”)
terça-feira, 24 de janeiro de 2012
ar*
josé luís peixoto, nenhum olhar
domingo, 22 de janeiro de 2012
um dia
foto: sophia por fernando lemos
Um dia, gastos, voltaremos
A viver livres como os animais
E mesmo tão cansados floriremos
Irmãos vivos do mar e dos pinhais.
O vento levará os mil cansaços
Dos gestos agitados irreais
E há-de voltar aos nossos membros lassos
A leve rapidez dos animais.
Só então poderemos caminhar
Através do mistério que se embala
No verde dos pinhais na voz do mar
E em nós germinará a sua fala.
Sophia de Mello Breyner
hoje
ao meu lado, o thiago abraça a irmã e o sobrinho do outro lado do oceano pelo ecrã do telefone...
a celine encontra a filha pelas primeiras horas da manhã e lembra-a dos beijos e dos passeios que vão dar assim que chegar.
não sabemos muito bem onde a distância nos une a todos.
sabemos que quem nos importa está longe. mas está sempre ali. procura-nos. que a alma encontra olhares no tempo que passa. e sentimos. trazemos connosco a fúria de quem não quer perder o tempo que foi com eles e queremos encontrar depressa. ontem.
abro cifras e a neve mostra-se nas imagens. faz frio e ali todos se encontram.
brooklyn. lisboa. são paulo. lausanne. tu. o pai. algures os braços abertos que nos esperam.
sei que esperas assim que o comboio se aproximar da linha. e do pescoço que dormir, será o conforto de sempre. é isso que nos move e nos faz seguir. juntos. todos os dias por vir.
sexta-feira, 20 de janeiro de 2012
ars poetica
As a globed fruit,
Dumb
As old medallions to the thumb,
Silent as the sleeve-worn stone
Of casement ledges where the moss has grown --
A poem should be wordless
As the flight of birds.
*
A poem should be motionless in time
As the moon climbs,
Leaving, as the moon releases
Twig by twig the night-entangled trees,
Leaving, as the moon behind the winter leaves,
Memory by memory the mind --
A poem should be motionless in time
As the moon climbs.
*
A poem should be equal to
Not true.
For all the history of grief
An empty doorway and a maple leaf.
For love
The leaning grasses and two lights above the sea --
A poem should not mean
But be.
a. macleish, ars poetica, 1926
quarta-feira, 18 de janeiro de 2012
a vontade traz tanto
«principalmente o inesperado.
sabe bem. toca fundo.»
e perguntamos da essência e do visível, aquilo que realmente fica.
e é a voz, sempre a voz. para lá do que se vê. além do que marca a pele.
é o que se ouve. «mergulhado nessa eternidade».
nbf *
segunda-feira, 16 de janeiro de 2012
existem relâmpagos
tu és um deles.
«porque assim é como reinas por aqui»*
sábado, 14 de janeiro de 2012
grandes nomes são sempre 3
lembrar sexta-feira 13, nbf
heart of glass
Soon turned out had a heart of glass
Seemed like the real thing, only to find
Much of mistrust, love's gone behind
Once I had a love and it was divine
Soon found out I was losing my mind
It seemed like the real thing but I was so blind
Much of mistrust, love's gone behind
In between
What I find is pleasing and I'm feeling fine
Love is so confusing there's no peace of mind
If I fear I'm losing you it's just no good
You teasing like you do
Blondie
sexta-feira, 13 de janeiro de 2012
permeável
jean cocteau, visão invisível
trad. aníbal fernandes
nas cordas
conhecemos um homem pelo seu riso; se na primeira vez que o encontramos ele ri de maneira agradável, o íntimo é excelente.
dostoievsky
devolver à casa o teu corpo para que me habites. isto anda tudo ligado
13
começa o dia do nosso azar :)
quinta-feira, 12 de janeiro de 2012
«a man who has never been hungry may possess a more refined palate, but he has no idea what it means to eat»
harry mulisch, the assault
mas isso não é uma palavra
Vem com um homem às costas,
vem com cem homens nos teus cabelos, vem com mil homens entre os seios e os pés, vem como um rio cheio de afogados que encontra o mar furioso, a espuma eterna, o tempo.
Trá-los todos até onde te espero: estaremos sempre sozinhos, estaremos sempre tu e eu sozinhos na terra para começar a vida.
staande klok
Besides, whoever keeps the future in front of him and the past at his back is doing something else that's hard to imagine. For the image implies that events somehow already exist in the future, reach the present at a determined moment, and finally come to rest in the past. But nothing exists in the future; it is empty; one might die at any minute. Therefore such a person has his face toward the void, whereas it is the past behind him that is visible, stored in the memory.
harry mulisch, the assault
ever since this world began
A shadow crossing the sky,
Free from hope and this misery.
She's beautiful, so beautiful away from me.
She is free.
She is free.
jeff buckley
home is whenever you call me on my timezone
quarta-feira, 11 de janeiro de 2012
terça-feira, 10 de janeiro de 2012
regra número um
regra número dois
deixa-se o prato limpo depois de comer.
regra número três
sobras não se oferecem a ninguém.
2+2=5 ou o que é que eu estou aqui a fazer?
Meti-me na política aos 17 anos, estive preso pela PIDE, fugi para França em 1963 e voltei em 1974. Desde 64-65 e até há poucos anos, estive sempre ligado à extrema-esquerda de inspiração maoista. Como não sou realmente um político,
mas sim músico, letrista e cantor, nessas pertenças e fidelidades fui sempre guiado por duas coisas:
- os grandes valores que, num artista, naturalmente convocam um lastro de radicalidade e, por outro lado,
- a fidelidade a homens políticos cujos escritos e posições públicas me foram parecendo melhor exprimir politicamente essa radicalidade.
O que me levou a ir entrando e saindo de colectivos onde me sentia em casa. Mas como afirmei pouco antes de deixar o último, que ajudei a fundar: "eu nunca saí de partido nenhum, os partidos é que foram saindo de mim".
As organizações políticas em que participei foram saindo de mim por duas razões principais, e supostamente opostas embora me pareça que são a mesma razão com sinais inversos, razões essas que nada têm de novas porque já vêm desde
o último quartel do séc. XIX:
- ou perderam em radicalidade o que ganharam em "realismo", que é o eufemismo que usam para designar a capitulação e a adaptação ao capitalismo;
- ou se confinaram e estiolaram em pequenos grupúsculos, seitas e partidecos que, perdendo o contacto com o real, se satisfazem autofagicamente a proclamar verdades definitivas, directivas infalíveis para as massas e são totalmente
incapazes de viverem hoje do modo como dizem querer que seja a sociedade de amanhã, prefigurando-a desde já em si mesmos.
A história da Praça Tahrir é diferente, e eu, que vivi o Maio 68 em Paris e o PREC em Portugal, regozijei-me, como toda a gente de bem, por mais uma queda de um ditador conseguida pelo clamor e pela coragem das ruas. Tempos novos,
formas de luta novas.
Tenho tentado reflectir sobre isso e o seu alcance, à luz da única coisa que mantenho bem viva: a minha recusa da iniquidade do capitalismo, a minha exigência de "outra coisa" que "essa é que é linda" (ver, por exemplo, http://passapalavra.info/?p=40478).
Mantenho também um interesse continuado - mas forçosamente à distância - pelos poderosos movimentos sociais de base do povo pobre do Brasil, da Argentina, do México, e de outros países, que têm vindo a lutar por coisas essenciais
como terra para cultivar, tecto para se abrigar, direito à água, à cidade, ao trabalho, ao descanso, etc.
Estes, só posso segui-los à distância porque, em Portugal, há tanto tempo que não há nada que se pareça; o povo parece apático, cheio de medo, sem raiva nem desconcerto, sempre bem enquadrado por uma elite de burocratas que há 30
anos o fazem gritar que "o custo de vida aumenta, o povo não aguenta" e a classe dominante a rir-se lá em casa respondendo "aguenta sim senhor, a prova é que gritam o mesmo há 30 anos!".
Convenço-me de que, neste longo caminho aos sacões, deixou de haver - por muito tempo - lugar para generalidades, para proclamações (gerais), para grandes desígnios colectivos. Há lugar, sim, para lutar começando pelo que está perto,
pelo que está em baixo, pelo que está agora: o que está mal na minha casa, no meu prédio, no meu bairro; o que está mal na minha empresa, onde por definição não existe democracia, mas que é o centro da minha sobrevivência; na minha
escola, seja eu aluno (força de trabalho em formação) seja eu professor (formador de força de trabalho), aquele o produto, este o produtor. Um período que será longo, de lutas defensivas e de lenta reacumulação de forças. O selo de
qualidade daquilo a que se chama "lutas" é agora, para mim, a sua concretude, porque a maior parte daqueles que se dizem militantes confundem acção com actividade - e não é de agora.
Plataformas como a 15O são somatórios que só podem ter o peso que é, no melhor dos casos, a soma do peso das suas parcelas. O mesmo direi do que poderão ser o 21 de Janeiro e outras datas afins. O grande erro - parece-me - é que
quase toda a gente pensa "o que é que eu vou lá buscar?", quando deveriam pensar "o que é que eu vou lá levar?". É como nos grupos artísticos: a criação colectiva resulta do que se vai pondo na cesta comum ao longo dos dias, esses dias
em que parece não se passar nada. É esta a minha visão, completamente wilhelm-reichiana.
E isto passa-se mais assim nas revoltas de "classe média" do que propriamente nas revoltas dos pobres-mesmo-pobres. E acho que percebi porquê. É que, contrariamente aos pobres cuja vida toda é dar sem receber, as "classes médias",
que têm ainda muito a perder, não sabem como se pratica o verso de Fernando Pessoa: "Só guardamos o que demos". Duvido até que o compreendam. Por isso "vão lá buscar", em vez de "irem lá levar".
Para o capitalismo, ou antes, para os capitalistas, a produção de bens imateriais (serviços, cultura, lazer) tornou-se desde há muito uma produção em massa para uma massa de consumidores (que são, em grande parte, os seus
produtores), como se fossem pão, detergentes, casas ou carros. Mas a "classe média", que está a sofrer um lento processo de proletarização, tem vindo a ser proletarizada (incluindo os profissionais liberais - advogados, médicos,
professores, artistas plásticos ou performativos) mas ainda não teve tempo nem experiência para deixar de ser pequeno-burguesa - individualista, idealista, socialmente apática e pusilânime.
[NOTA: eu não estou a afirmar que os proletários têm consciência proletária, bem pelo contrário, infelizmente a esmagadora maioria deles está também impregnada de uma cultura e de uma moral burguesa que lhes é injectada em doses
cavalares a toda a hora; mas a própria vida prática se encarrega de lhes tornar evidente a classe a que pertencem; só que, não vislumbrado como sair disso, não se arriscam.]
Daí que, nas acampadas, haja aquele ar de carnaval sociocultural, onde se fala de coisas muito sérias, o que é bom, mas onde o carburante são as palavras em si mesmas, e não o gesto. Não é radicalidade, mas sim e apenas uma
transgressão, uma aparência de radicalidade. Vou para o meio de uma praça, levo à boca as mãos em concha e grito "Quero mudar o mundo!"; mas as formiguinhas vão passando de lado, no seu afã de escravas; só fica, eventualmente,
quem não precisa de fazer o gesto imediato da sobrevivência. Passe a conversa à Raúl Brandão... mas estou enganado?
O meu tema actual - que, como a palavra indica, está cheio de promessas - é o vazio. "Le creux de la vague". Não, ainda, o súbito recuo do mar na praia antes do tsunami, mas um intervalo côncavo de duração não mensurável entre dois
ciclos históricos. Não creio que se possa descer mais fundo, e isso dá-me esperança. É preciso que a juventude "média" dê o salto para o lado de lá, onde estão os pobres a sofrer, muito calados, sem (des)tino. "Vou ao fundo da lama / Do
outro lado / Do outro lado da mente / Do outro lado da gente / Do lado da gente do outro lado / Do lado da gente que vive de frente / Da gente que vive o futuro presente" (Margem de Certa Maneira, 1972 (!!!)).
Por isso... talvez apareça, não prometo. Estou a tratar do que está aqui perto: fazer música e mais música, inventar novas canções, novos espectáculos, ajudar outros músicos a serem melhores. Ler e ouvir música. Cantar de vez em
quando as canções que tenho para dar ao público. É isso.
Carta de José Mário Branco (músico e poeta) ao 15 de Outubro
isobel
apaixonada pela timeline da björk.
e até junho sei que vou conseguir pronunciar correctamente o seu nome de família.
e ainda porque agora te perdias no tema
pedro jordão* :)
faz um mês
a vizinha de cima ficou sem internet para nos dar a nós. faz frio e ninguém se importa.
perguntas-me pela enésima vez se sais em salgueiros. que à volta não há metro. e não tens carta mesmo que quisesses voltar.
a lua entra pela janela, de vidraça larga.
amo ser de outra cidade, de outros costumes, só para poder dizer que isto pode ser maravilhoso e pede deferimento.
se te atreves a parar, algo te lembra
pedro jordão *:)
domingo, 8 de janeiro de 2012
jack kerouac's letter to marlon brando
«I'm praying that you'll buy ON THE ROAD and make a movie of it. Don't worry about the structure, I know to compress and re-arrange the plot a bit to give a perfectly acceptable movie-type structure: making it into one all-inclusive trip instead of the several voyages coast-to-coast in the book, one vast round trip from New York to Denver to Frisco to Mexico to New Orleans to New York again. I visualize the beautiful shots could be made with the camera on the front seat of the car showing the road (day and night) unwinding into the windshield, as Sal and Dean yak. I wanted you to play the part because Dean (as you know) is no dopey hotrodder but a real intelligent (in fact Jesuit) Irishman. You play Dean and I'll play Sal (Warner Bros. mentioned I play Sal) and I'll show you how Dean acts in real life.
What I wanta do is re-do the theater and the cinema in America, give it a spontaneous dash, remove pre-conceptions of "Situation" and let people rave on as they do in real life. That's what the play is: no plot in particular, no "meaning in particular, just the way people are.»
só por causa disso. vou-te escrever*
«i biked here. teach me how to drive»
«i like a challenge
sábado, 7 de janeiro de 2012
sobrevivi ao drive
e trouxe de lá uma vontade imensa de voltar aos louros.
desde que sejam o goslin bad ass e tenham nas costas um escorpião bordado a dourado.
a bunch of crows flying over père-lachaise amongst snowfall
sometimes one of the most difficult things in life is to know which bridge to cross and which bridge to burn.
salgueiros - 1 / mouraria - 0
onde andam o raio dos galos que nem da varanda os vemos mas ouvem-se quando fechamos os olhos.
é a primeira luz do dia.
sexta-feira, 6 de janeiro de 2012
sentar
são trezentos e vinte quilómetros por semana.
oitenta por dia.
são traços perdidos, horas ganhas, pessoas reencontradas e o cansaço ao final do dia.
mas chegar a casa e as tuas mãos. sempre assim perto. não há cansaço que resista.
terça-feira, 3 de janeiro de 2012
mais branco
sabemos de antemão que só aprendemos à cabeçada.
é um defeito de fabrico de almas e corpos humanos como os nossos.
depois de casas arrombadas, trancas à porta.
depois de estraçalhados os viveres, cuidados nos dizeres.
enfim, um sem número de inutilidades verbais que apenas fazem sentido depois da dita. cabeçada. precisamos de folhas brancas. rascunhos.
acontece que das páginas em branco pode-se fazer praticamente tudo.
pode-se desenhar caminhos, regressos, palavras ou símbolos.
apagar. ou escrever melhor.
não existe nada mais nobre do que um livro onde a vida toma forma.
o cheiro das páginas, tentar adiar o fim, as últimas linhas. o que existe ali, na última frase.
e concluir que se escreve mais e com mais velocidade à medida que os nossos olhos aceitam o tornear dos dedos sobre o papel.
escrever. viver enredos. encontrar viagens e paradeiros incertos. recomeçar.
já sabia que ia acontecer algo do género para por à prova o jogo de cintura
Devagar, aproximo a colher, oblíqua, do centro do prato. Por um instante, a circunferência de caldo e a colher formam um exemplo geométrico, são como a ilustração de ângulos num manual de matemática. Sinto o cheiro a conforto morno, a casa, a bem-estar, a inverno agasalhado. Abro caminho com a ponta da colher entre fios de couve, finos e embaraçados como ninhos de pardais. Quando a colher já está cheia e a levanto, não penso em mais do que na sua própria imagem. Fixo-a como se já lhe soubesse o sabor. Confirmo o melhor desse conhecimento no fim do gesto. Caldo verde. Fecho os olhos por um momento.
Após esse momento, o mundo reaparece. A minha mãe dá voltas à mesa. Tem pressa talvez por não querer que este tempo acabe. A sua imagem pisca de um e de outro lado da mesa. Antes de eu chegar, eu sei que a minha mãe enrolou folhas de couve na mão. Aproximou-as das lâminas do aparelho de ferro que as cortou em fios, a rodar por meio de uma manivela, preso à mesa por um grampo. Tenho essa memória desde pequeno, o som das folhas grossas de couve a serem cortadas, a sua cor verde-escura e o seu cheiro fresco, também verde. A voz da minha mãe mistura-se com o sabor da sopa. Diz-me: sabes quem é que morreu? Não sei, mas quero saber. Então, a minha mãe perde a pressa. Faz uma pausa para dar dois ou três passos, que se ouvem chinelados no chão. Dentro de mim, preencho esse silêncio com uma sucessão de rostos da minha infância.
josé luís peixoto
segunda-feira, 2 de janeiro de 2012
ewige wiederkunft.
nietzsche, a gaia ciência
we should crash the party on new year's eve
e no primeiro dia do ano
depois da chuva que se ouvia sem parar lá fora
depois de ter a certeza que não me ia levantar para mais nada...
arranjei coragem para finalmente por os olhos nisto.
e acudiu-me aquela aflição conhecida de saber na pele o correr dos dias e das horas e de como são valiosas. todas elas.
biutiful, alejandro gonzález iñárritu, 2011