"(...) É óbvio que esse tipo de diálogo, que não precisa de uma conclusão para ter significado, é mais adequado aos amigos e mais amiúde por eles mantido. A amizade consiste, em grande parte, na verdade, nesse falar sobre algo que os amigos têm em comum. Ao falarem sobre o que têm entre si, isso se torna muito mais comum a eles. Não só o assunto ganha a sua articulação específica, mas desenvolve-se expande-se e finalmente, no decorrer do tempo e da vida, começa a constituir um pequeno mundo particular, que é compartilhado na amizade. Por outras palavras, Sócrates tentou tornar amigos os cidadãos de Atenas, e esse foi realmente um objectivo muito compreensível numa polis cuja vida consistia numa intensa e ininterrupta competição de todos contra todos, de aei aristeuein, que, sem cessar, buscava-se demonstrar ser o melhor de todos. (...) A igualação política, não-económica, é a amizade, philia. (...) A igualação na amizade não significa, naturalmente, que os amigos se tornem os mesmos, ou sejam iguais entre si, mas, antes, que se tornem parceiros iguais num mundo comum - que, juntos, constituam uma comunidade. O que a amizade alcança é justamente a comunidade e é óbvio que essa igualação traz em si, como ponto polémico, a diferenciação sempre crescente dos cidadãos, inerente a uma vida agonística. Aristóteles conclui que é a amizade, e não a justiça (como afirmava Platão na República, o grande diálogo sobre a justiça), que parece ser o vínculo nas comunidades. Para Aristóteles, a amizade está acima da justiça, porque a justiça deixa de ser necessária entre amigos.”
hannah arendt, a condição humana
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