terça-feira, 14 de junho de 2011

inteligência, vulgo ruína

e depois há os que se acham polidos, donos da verdade. correctos. limpos.
mais bonitos.
e mentem. como todos os outros. e acham que ninguém vê. que ninguém percebe.
que andamos a ver os seus actos exemplares incólumes.

jogadores de palavras.
juras de amor eterno que batem a persiana de um outro alguém quando a noite vai alta.
amizades fingidas à lei do maior protagonista.
sorrisos, pensares que se perdem na fanfarronice da auto-promoção.
singelos chegares de ouvidos a orelhas mocas que decidem não ouvir. mais nada.


os erros e as dúvidas da inteligência desaparecem mais depressa, sem deixar rasto, que os erros do coração; desaparecem não tanto em consequência de discussões e polémicas como graças à lógica iniludível dos acontecimentos da vida viva, que às vezes trazem consigo o verdadeiro escape e mostram o caminho adequado, senão logo, na primeira altura, num prazo relativamente breve, em certas ocasiões, sem haver necessidade de se esperar pela geração seguinte. com os erros do coração o mesmo não sucede. o erro do coração é de maior monta; significa que o espírito frequentemente, o espírito de toda a nação, está doente, sofre de qualquer contágio e não poucas vezes essa enfermidade, esse contacto, implicam tal grau de cegueira, que toda a nação se torna incurável... por mais tentativas que se façam para a salvar. pelo contrário, essa cegueira desfigura os factos a seu talante, deforma-os segundo as delirantes visões do espírito doente e até pode suceder que toda a nação prefira ir para a ruína conscientemente, quer dizer, conhecendo já a sua cegueira, a deixar-se curar... pois já não quer que a curem.

Fiodor Dostoievski, in "Diário de um Escritor"



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